TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Quem me levará sou eu - José do Vale Pinheiro Feitosa

E no planisfério daquela minúscula bola azul há um porta por onde se entra e outra por onde se vai. Não se sabe bem se tudo se desmancha no revelo de planícies, planaltos, vales e montanhas. Mas de algum modo há uma porta de saída não se sabe se é apenas uma porta e nada mais, assim como do mesmo modo que ao entrar não se sabe se havia um lugar de onde vir.

Mas o certo é que nesta levada que a mim toca ir adianta posso dizer a todos os meus que “a gente se vê depois. Tarde, toda tarde ir fiando, no silêncio a costurar, noite no bordado, vem chegando em retalho e põe estrelas no lugar.”

Prometo a todos que serei a costureira do lugar. A todos vocês: Anastácia, Alceu Valença, Chico Buarque, Clodô, Climério, Djavan, Fausto Nilo, Gilberto Gil, Guadalupe, Manduka, Nando Cordel, Renato Teixeira e todos que dessa agulha comigo costuraram.

Na levada comigo mesmo levo a “sede de rio e a fome de pão.” “A sede do rio quem bebe é o peixe e sede de pão quem come é o chão. Apôs tá certo,” vim desde aquele “arrebol” de Garanhuns, “arrastando as alpercatas”, junto ao meu “anjo de guarda,” buscando “casa comida e paixão” e foi ai que “bateu no coração.” A “catingueira fulorou,” “vim de mala e cuia” “de volta pro aconchego.” E ói aqui “nós dois de testa”, tem tempo que “tudo é mel” e noutras horas o amargor do fel amanhece na nossa porta. 
 
Pois “eu sou do mundo,” pelas “costas do Brasil” traçando riscos na poeira, o “sertão me espera” e são “tantas palavras” como tantas são as dobras deste morim das saias das morenas. “E quando chega o verão é aquele desassossego no coração,” aquele sol bronzeando os desejos em forja de brasa.  São “sete meninas,” são todas as meninas. Algumas em cachos de pitomba, uma ruma são vagalumes na vereda, outras uma pluma de talco amaciando as pontas da vida. Mas de tudo quero, o que mais quero é um xodó. Aliás, “eu sou quero um xodó.”

“Estou de volta pru me aconchego, trazendo no peito bastante saudade.” Esse mato e essa terra e peço a tu, “não sai de perto de mim.” Mas a separação quando existe tem a trena da saudade. “Estou com saudade de tu, meu desejo, com saudade do beijo e do mel do teu olhar carinhoso, do teu abraço gostoso, de passear no teu céu.”

E posso dizer que levo a guia e logo na primeira parada “abri a porta.” “E apareci e a mais bonita sorriu pra mim. Nesse instante me convenci o melhor da vida vai prosseguir. Por este céu azul, onde a lei seja o amor e o bom e o melhor seja comum a qualquer um, seja quem for.” E neste lugar “cheguei para ficar.” “Nos olhos trago esperança, no coração trago amor e no futuro muita crença.”

“O amor não é sofrimento, não é tormento, não é dor, não existe lamento, o amor é o amor.” “Estrelas somos nós, dois vaga-lumes sós, dois objetos sós, tão sós, tão sós vamos vagando no ar.” Flutuando sem a economia do ar, a contabilidade da água e os custos dos alimentos. Vagando acima das posses, das cercas proprietárias, das contas bancárias, da renda e do imposto sobre a renda. Mas vagando acima destas coisas sem jamais esquecer das pessoas e tantas possibilidades de costurar a vida de modo tão surpreendente como o nascer de uma estrela.

“Amigos a gente encontra, o mundo não é só aqui. As coisas que eu tenho aqui, na certa terei por lá. Segredos de um caminhão, fronteiras a desvendar. Passar como passam os dias e se o calendário acabar eu faço contar o tempo outra vez. Tudo outra vez a passar. Quem me levará sou eu, quem regressará sou, não diga que não levo a guia de quem souber me amar.”

Atenção: texto construído com as letras das canções de Dominguinhos e seus parceiros. 

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