TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

quarta-feira, 31 de março de 2010

Autonomia universitária - por José do Vale Pinheiro Feitosa

Antes de tudo uma constatação: a base da autonomia universitária (na prática atual) é a eleição para os cargos executivos da Universidade. O modelo de representação com um colégio eleitoral intramuros (tudo aquilo que não pertence à extensão) no entanto não consegue, e nem poderia, se excluir da luta política geral. É que a instituição universidade é tão poderosa e forte nas definições de corações e mentes e das políticas públicas que tudo reflui para disputa pelo poder em geral na sociedade. Portanto dos partidos políticos e dos rachas ideológicos naturais em luta.

Deste modo o que seria a autonomia, resvala para um processo de luta entre governo e oposição e que nem sempre coincide com os verdadeiros interesse de uma universidade (já explico), seja a sociedade, o corpo de professores, funcionários ou alunos. Numa sociedade tradicional como esta do Cariri, especialmente o Crato, o molho desta luta se apimenta, estraga o sabor e se resume às consequências da má digestão. Tipo qual o colega mais intragável ou as alianças mais indigestas.

Só que aí a autonomia já foi pru brejo e quem perde é a sociedade. Verdadeiramente a sociedade do Cariri pois de outra forma não teria sentido o Estado ter criado uma Universidade específica para a região. Ficava com a UECE mesmo. Por isso é preciso entender que a autonomia universitária é antes de tudo territorial, é mais que um conceito ou um preceito. É um entender as necessidades do território que já é impossível de se colocar como espaço puramente regional, pois o mundo todo já se encontra em franco processo de globalização ou muito mais, de planetarização verdadeiramente. Especialmente para um região como esta que é um verdadeiro ecosistema.

Qual o projeto político de desenvolvimento regional? Qual a verdadeira demanda dos principais agentes regionais? Quais problemas de desenvolvimento sustentável, de economia, cultural, social e político que precisam de solução ou de evolução? Qual o estágio de desenvolvimento da gestão pública em termos de eficácia, eficiência e bem estar social (ela é uma universidade pública)? Quais os cenários futuros para a região? São apenas algumas questões que deveriam se encontrar no programa de ciência, tecnologia, ensino e entensão da Universidade. E a autonomia universitária se refleteria neste programa.

Mas alguém poderia perguntar: e que autonomia seria esta a depender de tantos agentes externos à própria universidade? Apenas pediria que refletisse sobre os maus momentos em que a burocracia do estado se isolou da sociedade e passou a existir por ela mesma. Como sei que não é esta a pergunta, passo ao seguinte.

Quando Violeta Arraes foi assumir a URCA, tive a oportunidade de grandes encontros com ela, Pierre e mais outras pessoas da região. Havia uma idéia que a URCA deveria se dedicar inteiramente ao desenvolvimento do Cariri. Que todo o seu projeto deveria nascer desta necessidade. E que só nasceria assim se a Universidade fosse capaz de atrair para o seu espaço conceitual a própria sociedade regional. Se os professores, funcionários e alunos se especializassem em estudar seus problemas e necessidades e assim criar uma autonomia verdadeira, pois legitimamente assentada não numa ciência abstrata, mas na aplicação da ciência e tecnologia ao estrato real da vida das pessoas.

Tudo é muito difícil. O sistema de remuneração, os hábitos didáticos, as hierarquias e as lutas internas, sem contar o despraro da maioria para este tipo de ação. Mas em nenhum lugar do mundo em que estas transformações ocorreram aconteceu de fora para dentro. Uma sociedade se transformava com a capacidade de mobilizar e transformar suas instituições.


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