TRIPULANTES DESTA MESMA NAVE

terça-feira, 31 de julho de 2007

PERDEMOS Michelangelo Antonioni! (click na imagem e veja o trailler de L`Avventura)


É algum festival de cinema que vai acontecer no Céu?

Vida !


Amigos,

Estava faltando responder ainda à chamada geral deste Blog um dos mais criativos e originais compositores brasileiros, o cratense Abidoral Jamacaru.Reconhecido e citado piblicamente por artistas como Chico Cézar, Zeca Baleiro e Nélson Mota É que como todo gênio, o velho Bida construiu um mundo próprio e o vem tentando colocar no lugar deste outro tão insulso e apoético.Como Bispo do Rosário , neste trabalho de construção/desconstrução, ele montou o cenário e a belíssima trilha musical do novo planeta. Pois bem, está finalmente terminado ( pronto para prensagem) o seu terceiro CD que tem ainda o nome provisório de Bárbara .Dono de uma extensa obra musical salta-nos aos olhos a iniquidade cultural brasileira, quando permite que a oxente music lance trash-discs todo dia e a obra de um compositor do porte de Abidoral durma no anonimato.Mas, mesmo a fórceps, seu terceiro filho está prestes a nascer, para encanto do Cariri. Este vídeo(algo noir ao contrário do CD) mostra uma das suas mais bonitas interpretações no novo disco, a música VIDA, um sensível Hino à preservação da do planeta Terra.É apenas um pequeno couvert para a lauta ceia que há de vir. BIDA!

Novo leiaute (em português, mesmo) da CaririCult!

Artista é uma peste: mexe e remexe no que pode.
Criei uma espécie de capa (no lugar do cabeçário), refiz o título com maiúsculas e minúsculas intensionalmente e substitui a imagem de fundo por uma mais gráfica. Não aceito protestos!

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Ramon




- O silêncio é uma rua de janelas fechadas - pensou em voz alta.


À luz da lua, avistou na areia branca da praia as imóveis caveiras de elefantes, restos encalhados de barcos de pesca. Lembravam as costelas de um paquiderme, desmanchando-se ao embate das ondas. Se a maré subia, naufragavam; se baixava, as proas pediam socorro.

Fazer o quê? O avô quisera assim.

- Os homens inventaram os cemitérios.

Ramon acendeu um cigarro e riu. Nunca contava os cigarros fumados, nem olhava as fotografias que ilustravam as embalagens, para não se amedrontar e desistir do vício. Um homem numa máscara de oxigênio. O Ministério da Saúde adverte: fumar provoca câncer de pulmão. A foto que mais o atemorizava era a de um cigarro com as cinzas arqueadas, sugerindo algo que baixou e não levantará mais nunca. O Ministério da Saúde adverte: fumar causa impotência sexual. Meninos desnutridos, mulheres grávidas, membros ulcerados. Ele mesmo perdera os dentes. Caíram por causa da infecção, um a um.

Como os barcos que o avô deixou encalhar na praia, depois que adoeceu e não podia se aventurar nas águas profundas.

- Nunca mais sairão à pesca.

As madeiras apodreciam, os tabuados finos soltavam-se das vigas, a maresia comia os ferros. Do jeito que se decompunham os elefantes mortos na savana. Primeiro, os caçadores arrancavam as presas de marfim. Depois, as aves de rapina devoravam os olhos, furavam o couro e comiam as vísceras. Por último, as hienas se banqueteavam com gorduras e carnes. Restavam os ossos, arreganhados para o céu, sem nenhum pudor. Iguaizinhos aos barcos.

Ramon não ligou para a metáfora do poema e riu alto. O silêncio é uma fileira de barcos arruinados. Alguém deixaria de se divertir com a imagem de caveiras de elefante, enfileiradas e silenciosas? Achou que era um gênio do humor, e riu até se engasgar com a nona taça de vinho. Tornou-se sério apenas quando acendeu outro cigarro. Sem querer, viu a foto de um menino raquítico.

Nunca visitara a África, onde os meninos desaprendiam a mastigar, porque não comiam. O Ministério da Saúde adverte: fumar durante a gravidez causa problemas ao feto. Ainda bem que ele não corria esse risco. Mais uma vantagem em nascer homem, os espermatozóides não sofrem desnutrição pelo tabagismo. Nem pelo álcool.

Encheu a décima taça e olhou através da janela. Era a única aberta na rua. A única com as luzes acesas e gente espreitando. Ele.

Do outro lado, a praia, os barcos que o avô deixara encalhar quando soube que estava morrendo. E o mar.

O avô lhe presenteara com um maço de cigarros, ao completar treze anos. Ensinou-o a desfazer o invólucro de celofane, a tragar e a expelir fumaça pelo nariz. Sempre fumaram juntos, até poucos dias antes do avô morrer de câncer de pulmão.

- Não acredito que isso faça mal.

Riram.

O avô contou sobre o único dia em que decidiu largar o vício. Pescava no mar alto. Não permitira que ninguém levasse cigarros na embarcação. Uma noite não suportou o desejo e deu ordens pra voltarem. Encontrou os botecos fechados. Bateu na porta de uma casa, pediu que lhe vendessem um maço. Pagava qualquer preço. Acendeu um cigarro e revoltou-se com a constatação de que uma coisa tão pequena o dominava. Jogou-o no chão e esmagou-o.

- Você é um homem letrado, mas o vício nos iguala - falou pra Ramon.

- É possível.

Mudos, os dois olhavam os barcos. Nos porões se desmanchando, nenhuma memória de peixes.

E o avô, de que se lembrava antes de morrer? Ele e Ramon amavam o silêncio acima de todos os bens. O silêncio que se segue a uma baforada, a fumaça pairando sobre as cabeças, como nuvens antes de uma tempestade. Em silêncio, todos os homens são iguais, como ruas de janelas fechadas.

Ronaldo Correia Brito


Ronaldo Correia de Brito é médico e escritor.
Escreveu Faca e Livro dos Homens.
Assina coluna na revista Continente.
Fale com Ronaldo Correia de Brito: ronaldo_correia@terra.com.br

O Cinema de luto: Bergman "The end" !

Ernst Ingmar Bergman (Uppsala, 14 de Julho de 1918Fårö, 30 de Julho de 2007)
Estudou na Universidade de Estocolmo, onde se interessou por teatro, e mais tarde, por cinema. Iniciou a sua carreira em 1941, escrevendo a peça de teatro "Morte de Kasper" e, em 1944, escreveu o primeiro argumento para o filme "Hets". Realizou o primeiro filme em 1945, "Kris".
Os seus filmes lidam geralmente com questões existenciais como a mortalidade, solidão e fé. As suas influências literárias vêm do teatro: Henrik Ibsen e August Strindberg.
Teve um romance com Liv Ullmann, com quem teve uma filha. Dirigiu a atriz em dez filmes, o primeiro dos quais foi Persona.
Talvez o melhor comentário sobre Ingmar Bergman tenha partido de Jean-Luc Godard:
"O cinema não é um ofício. É uma arte. Cinema não é um trabalho de equipe. O diretor está só diante de uma página em branco. Para Bergman estar só é se fazer perguntas; filmar é encontrar as respostas. Nada poderia ser mais classicamente romântico". (Jean-Luc Godard, "Bergmanorama", Cahiers du cinéma, Julho - 1958). [1]

Bom momento para rever clássicos como: "O Sétimo selo", "Morangos Silvestres"," Fanny e Alexander"," Gritos e Sussuros", "Sonata de Outono" e outros que podem estar disponíveis no Sebo Alan Poe (de Manel, no Jota).

Bárbarie e Civilização



Por Antonio Cicero

"O bárbaro é, em primeiro lugar, o homem que crê na barbárie." Essa é uma das mais famosas proposições que se encontram na brochura "Raça e História", escrita por Lévi-Strauss na década de 1950, por encomenda da Unesco.Dado que, no contexto em que ela foi enunciada, as palavras "bárbaro" e "barbárie" têm um sentido pejorativo, trata-se de uma proposição paradoxal, pois, evidentemente, aquele que a enuncia crê na barbárie do homem que crê na barbárie: o que significa que ele está a chamar a si próprio de "bárbaro".É obviamente improvável que Lévi-Strauss tencionasse qualificar-se de bárbaro. Por um lado, a frase citada pode ser tida como uma mera "boutade", cujo sentido real, puramente negativo, seja justamente o de desmoralizar a própria noção excessivamente valorativa -melhor dizendo, pejorativa- de "barbárie".Por outro lado, ela parece ter a intenção positiva de afirmar que o verdadeiro bárbaro é aquele que não considera plenamente humano o membro de uma cultura diferente da sua; aquele que pura e simplesmente repudia as formas culturais, isto é, as formas morais, religiosas, sociais, estéticas, que sejam distantes das formas com as quais se identifica; aquele, isto é, que julga as formas das demais culturas segundo os critérios da cultura a que pertence; aquele, portanto, que a etnologia classifica de "etnocentrista".
Sendo assim, o civilizado é aquele que não julga as formas das demais culturas segundo os critérios da cultura à qual ele pertence. Que significa isso, na prática?
Três possibilidades se apresentam. A primeira é que o civilizado seja aquele que julgue as formas das demais culturas segundo critérios de uma cultura à qual não pertença.É evidente, porém, que tal pessoa não deixaria de ser etnocêntrica, tendo meramente posto uma cultura adotada no lugar da sua cultura nativa. Ela continuaria, portanto, a ser bárbara.
A segunda possibilidade é que o civilizado seja aquele que simplesmente não julga as formas das culturas às quais não pertença. Ao invés de ser uma solução, porém, isso seria um problema.Digamos, por exemplo, que eu, que acredito em direitos humanos, soubesse que uma mulher vai ser lapidada por ser adúltera. Nesse caso, eu certamente me revoltaria contra tal ato, a menos que julgasse que as pessoas em questão, não pertencendo à minha cultura, não eram propriamente humanas. Esta última hipótese, porém, seria exatamente o cúmulo da barbárie.
A única possibilidade que resta é que o civilizado seja aquele que julga as formas das demais culturas segundo critérios que não pertençam a nenhuma cultura particular: nem mesmo à sua cultura de origem.
Se isso for possível, o etnocentrismo é superado, não apenas no sentido convencional do termo mas também no sentido de que, para o indivíduo, a sua própria cultura deixa de ser absolutamente central: e talvez a vitória sobre este etnocentrismo seja uma condição necessária para a vitória sobre o etnocentrismo no sentido convencional.
Ora, tal distanciamento em relação à própria cultura a que se pertence é evidentemente possível, já que se dá na realidade.Ele ocorre cada vez que alguém critica uma manifestação da sua própria cultura. O distanciamento crítico é produzido pela razão que, longe de pertencer a qualquer cultura particular, é universal, uma vez que é, em princípio, acessível a qualquer ser humano.
Assim, o civilizado é aquele que reconhece que as convicções mais fundamentais -filosóficas, éticas, estéticas, religiosas etc.- de qualquer cultura, inclusive da sua, são falíveis. Ele reconhece que há muitas diferentes crenças no mundo, e que elas freqüentemente se contradizem: logo, que nem todas podem ser verdadeiras, e que é possível até que nenhuma delas o seja.
A razão crítica através da qual ele reconhece isso não é uma crença como as outras.
Ela é 1) a capacidade de pôr em dúvida todas as crenças; 2) a certeza lógica de que qualquer crença pode ser falsa e 3) a conseqüente certeza de que a afirmação de que uma crença determinada não possa ser falsa é logicamente falsa.Essa razão crítica é infalível porque, identificando-se com a própria capacidade de duvidar, afirma-se no próprio ato de duvidar de si. É a partir desse infalível princípio falibilista -e não a partir de crença alguma- que se constitui a civilização.

[Publicado na Ilustrada do jornal Folha de S.Paulo]


Antonio Cicero nasceu no Rio de Janeiro, em 1945. Formou-se em filosofia na Universidade de Londres. Poeta, tornou-se conhecido em finais dos anos 70 como o letrista das canções de sua irmã, Marina Lima. Publicou os livros de ensaios, O mundo desde o fim. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995; Finalidades sem fim. Ensaios sobre poesia e arte. São Paulo: Companhia das Letras, 2005 e os de poesia, Guardar. Rio de Janeiro: Record, 1996. (Prêmio Nestlê de Literatura Brasileira); A cidade e os livros. Rio de Janeiro, Record, 2002.
Blog: http://antoniocicero.blogspot.com
Site: http://uol.com.br/antoniocicero
E-mail: acicero@uol.com.br

O Veio da Vida




Acordou encafifado: meio barro, meio tijolo. Mundo se projetando algo sombrio, como um filme noir. As paredes da velha casa , opressivas , carregavam-se com aquele limo pegajoso e úmido das prisões.A vida resumia-se a alguns fragmentos desconjuntados do passado: um puzzle disperso, impossível de ser reorganizado.Rápido percebeu que faltavam resquícios de vida ao derredor , até mesmo porque o ambiente é apenas um mero reflexo das nossas luzes internas. Quem sabe, adornando aqueles interiores com o verde frescor de alguma begônia, o mundo se re-imantaria de magnetismo vital ? Perambulou pelas ruas como quem procura um objeto inencontrável : o Santo Graal da felicidade desvanecida.
As rosas da floricultura lhe pareceram opacas e inodoras . Os pássaros na feirinha apresentaram-se profundamente silentes e apenas refizeram na sua alma a angustiante gaiola em que subitamente vira transformada, pela manhã , o seu “ Lar Amaro Lar”. Nem lojinha de animais de estimação melhorou-lhe o ânimo, sentiu-os como que empalhados e, num átimo, percebeu que o hamster, o periquito, o chihahua seriam incapazes de repovoar o deserto em que se transformara a casa. Sequer os peixes multicolores no aquário iluminado no cantinho da loja resplandeceram alegria e vivacidade.
Sentia-se como único sobrevivente de uma explosão nuclear, tentando refazer o mundo com os dispersos estilhaços que restaram. Desiludido , sem saber bem porque nem pra que, comprou de um vendedor introspectivo e frio, um aquário, sem água e sem peixes. Seguiu para casa com aquele trambolho e colocou-o , sintomaticamente vazio , na pequena estante da sala que abrigava a TV. Pressentiu, com os dias, que aquele aquário como que representava um retrato da sua alma: oca, ressequida e sem aparente utilidade. Aquela imagem, estranhamente, aumentou o ar denso e quase irrespirável da sala.
Saiu, no outro dia, em busca , de um habitante para o aquário. Na esquina encontrou um vendedor de fósseis e , num ímpeto, adquiriu um pequeno peixe petrificado. Em casa colocou-o cuidadosamente dentro do aquário. Com o passar dos dias foi como se a sala se iluminasse. Já não existiam objetos ao derredor, o fóssil no aquário da sala alegrava-lhe a vida, mas , por outro lado, mantinha-o hipnotizado e submisso. Não mais saiu à rua, deixou de atender telefone, a TV já não tinha qualquer sentido. Algumas semanas depois começou a notar que as paredes da casa se iam tornando mais escuras e compactas e avançavam em direção ao centro , como se fossem se encorpando, dia após dia. Passou a perceber em si mesmo a pele mais escura e endurecida e com o passar do dia se foram transformando em escamas. As articulações se foram emperrando até leva´-lo à total imobilidade. Um belo dia as paredes da sala o aprisionaram definitivamente. Desde então aguarda , ansiosamente, as pancadas do martelo que rompam o veio da pedra e mostrem seu testemunho petrificado para a estonteante mobilidade da vida.

J. Flávio

Depois da capela tem um abismo – livro de poesia de Marcos Leonel



Nos anos oitenta, no Cariri cearense, se respiravam os primeiros hálitos de uma nova mística. Era um fenômeno completamente próprio, que se estendeu pelos anos noventa inteiros e desaguou nos dias de hoje, mas já caldo ralo. Foi mais ou menos assim: a nossa juventude rompeu a visão frígida e estéril da fé (aquela vendida nas matrizes, em envoltório sacrossanto, especialmente católico, que tinha Cícero Romão Batista como centro) e, influenciados pelo ambiente universitário de Fortaleza e Recife, construiu para si mesma uma visão de mundo absolutamente idiossincrática. Um Cariri quase cenográfico”.

Assim começa a apresentação, de Sidney Rocha, do livro Depois da capela tem um abismo, do poeta cratense Marcos Vinícius Leonel, por nós conhecido por Lobisomem, editado pela Kabalah Editorial, Recife, 2007.
O livro traz um longo poema, escrito em meados dos anos 80, dividido em doze cantos, cada um com oito estrofes, cada uma com oito versos, com imagens e impressões de um andarilho que sobe a serra do Horto, a caminho do Santo Sepulcro, depois da estátua do padre.

Assim começa:

Dos altares e templos
Erigidos pelos povos que
Habitam e remontam
O plistoceno ao Cariri
Nada guarda tão sublime,
Como esse vale desnudo,
Os mistérios e caminhos
Para a fuga de Érebo.

E Assim termina:

A ti eu peço, que nesse dia,
Não escolha palavras
Que me dê o silêncio,
Esse que a mata canta,
E as pedras respiram.
A grande força está presente,
Cruzando o meu caminho com o teu.
A ti eu darei o que te peço.

No entremeio, muitos e muitos versos fortes e vigorosos, cheios de mistérios, tal qual a história de Juazeiro; palavras e mais palavras tortuosas e íngrimes, tais quais os caminhos do Horto.

Ah, sim! O projeto gráfico e editorial do livro é um capítulo à parte.

O Zabumbeiro e o "ÔMI" ( parodiando Salatiel ) eheheh

Essa frase aí abaixo merece um vídeo:


Amigos,

Esse parágrafo seguinte vai ter de concorrer às frases mais controversas e Hilárias de 2007, e talvez da década, eheheh, foi postada agora há pouco por "Carlos Cruz" no Yahoo grupos chamado CratoAmado, em resposta a um convite feito para assistir ao lançamento do show do grupo Zabumbeiros Cariris. Resta saber em resposta ao "homem", que "ÔMI" será esse...

""Grato pelo convite, mas tenho certeza de que o Crato está precisando
mesmo é de homem(Político) forte, empreendedor, fazendo com que seus
filhos votem nos nomes da terra e não de bobagens de zabumbeiros
(cultura falida). Por isso que o nosso vizinho tem nos engolido a cada
dia que passa.

Atenciosamente,

Carlos Cruz
085-8752.34. 77""



????????????????????????

Créditos:
Música: ( vinyl ) - Eis o Ômi - Noriel Vilela
Fotos: Dihelson Mendonça

domingo, 29 de julho de 2007

O homem e a folha


Entardece no mundo.
O céu está pintado em tons de roza-cinza-azul e anuncia a possibilidade de chuva naquela pequena reserva de floresta tropical. Pequenos animais buscam as suas tocas adivinhando um temporal. Um homem já velho, magro e nu, caminha tranquilamente e humaniza a paisagem. Sua face é uma bela máscara esculpida pelo tempo e expressa a paz que carrega dentro de si. Um forte vento balança as folhagens das árvores e começa a chuva. As folhas secas tentam, mas não resistem à força natural e começam a cair. Uma delas, em movimento anguloso e lânguido parece aproveitar o vento para bailar. O homem observa com naturalidade e abre um sorriso: a folha transformara sua queda- precipício, princípio da morte - numa dança? Sereno, continua seu caminho. Absorve todos os tons de luz daquele momento mágico e ouve os pássaros, o som das águas e...vozes de crianças(?) que parecem brincar. Fica atraído pela algazarra. Anda mais naquela direção até que chegar a uma pequena cachoeira que derrama suas águas num pequeno poço. Numa miragem, crianças-curumins pulam no poço, bebem água da fonte e se enlameiam e se banham e brincam com a vida. O homem sorrir e deita-se na água como se o poço fosse uma cama. Nesse instante a folha - levada pelo vento – cai no poço e flutua no espelho da água. Os dois parecem descansar.A natureza fica em silêncio como se respeitasse o momento. A folha se assenta sobre o corpo do homem. Ele, num ritual, pega a folha delicadamente e a observa por algum instante. Com carinho, coloca a folha num pequeno córrego para que siga o seu bailado. A folha flutua e navega sem destino. Cadê o homem? No poço apenas uma criança-curumim brinca com a lama e se banha numa água de cristal...
A noite chega e uma lua nova brilhante flutua no céu


Luiz Carlos Salatiel
Rio, junho 2005/julho 2007

Cirque du soleil: Inspirador!



A mágica do circo nos remete aos melhores anos da nossa breve vida: a infância.

Digo e repito

Sou mais Beatles que stones
Mais Salatiel que romildo
Crato que juazeiro
mas se puder escolher de novo
sou mais Stones que beatles
mais Romildo que salatiel
Juazeiro que crato

Aviso aos navegantes!

A nossa CaririCult, por praticidade, fará seu arquivamento de postagens semanalmente. Entretanto, todas as matérias ficam disponibilizadas por data, neste mesmo blog (vide lado direito-inferior da pagina), e poderão ser acessadas sempre que o "navegante" desejar.

Socorro !


Pois é amigos, a Arte abre frestas na nossa percepção e nos possibilita ver o mundo em outras arestas, ângulos e dimensões. Na culinária não é diferente, há que se ter mãos de bruxo e sutilezas de equilibrista e mágico para conseguir aguçar a nossa memória gustativa. O Restaurante de Socorro Moreira , disparadamente, serve a melhor culinária no Cariri.Fica ali na Travessa da Penha, defronte à Solibral, vizinho à antiga gravadora do nosso Cleivan Paiva. Não bastasse suas artes de Gourmet, nossa anfitriã soma a isto tudo sua simpatia, seu carinho e bom gosto. Tudo está em seu devido lugar: a música, a decoração, o papo, a clientela e os quadros na parede do nosso inesquecível Normando. O Restaurante é Cult, escondidinho: como uma mocinha de respeito não se abre para todos nem para qualquer cantada. Tornou-se quase que um Clube.Aqui para nós do Cariricult, não existe local mais agradável em toda região para um Slow-Food. Confiram e, se gostarem, bico calado! Que Arte é artigo de luxo para ser degustado por poucos.Socorro !

sábado, 28 de julho de 2007

Recado de Carmem para a CaririCult!

LC(Salatiel), adoreeeeeeeei, ameeeeeeeeeei...tudo, os clips, as matérias novas do blog, tudo , tudo mesmo. Nossa, até fiquei emocionada com o "seja feliz"(letra: GeraldoUrano/ música: LCSalatiel). Me lembrou muito aquele tempo! Sabia que eu tenho esse poema do GU(Geraldo Urano), escrito por ele em um pedaço de papel de carteira de cigarro, numa madrugada dessas, pelos botecos do Crato?
Massa, muito obrigada, só você mesmo!
Beijos
Carmen Medeiros

*Carmem mora em Juiz de Fora (MG) e nos anos 80 morava em Brejo Santo e é admiradora dos artistas do cariri, especialmente Geraldo Urano.

Zabumbeiros: A gente recomendou o show.


Quem viu?

Agende-se

Grafites





Na entrada da Gruta do Sol, na Chapada da Diamantina, na Bahia, existe todo um paredão pictografado com impressionantes pinturas rupestres. Algumas , como uma mandala, gravada em quatro cores, enche os olhos de quem as vê. E lá estão postas, numa galeria toda especial, há pelo menos 10.000 anos Há desenhos que sugerem uma agenda , com inúmeros tracinhos empilhados , como se demarcando dias ou produtos de caça. Algumas figuras de animais e uns outros traços de espirais.Outras escrituras diversas existem aqui no Cariri, em Ingá, na Paraíba, no Amazonas. Que recado nossos irmãos primitivos desejavam deixar para a posteridade ?Certamente, de alguma maneira, gritavam para as gerações vindouras: Aqui estivemos ! Vivemos nestas terras, não nos esqueçam! É que não tinham quaisquer outras maneiras de registrar sua presença num mundo: sem escrita, sem TV, sem fotografia, sem cinema , sem internet. Aquela lhes pareceu a única possibilidade de deixar, para o futuro, alguma imagem que demarcasse sua presença nesta terra. Armstrong não fez muito diferente ao deixar a pegada do homem na lua e os alpinistas também fincam a bandeira de seus países nos picos mais inacessíveis . Os adolescentes grafitam os prédios mais altos para desespero dos proprietários, no intuito de afirmar : eu posso ! Mas , também , bravejam : Veja, estou vivo e sou capaz disso! Os enamorados gravam seus nomes nas árvores, no meio de um coração trespassado por uma seta de cupido, pretendendo mostrar para o mundo a força de seu amor, mas também para lhes imprimir um certo ar de eternidade.
Se repararmos bem, todas as nossas grandes ações, neste planeta, buscam, no fundo, a imortalidade. É que a vida é tão curta, de percurso tão frágil e imprevisível que todos , de alguma maneira, ensaiam deixar sua marca , seu registro, numa tentativa, última de eternizar-se. O escritor que publica o livro, o monge que ora no mosteiro, o pintor que expõe sua aquarela, o músico que compõe sua sinfonia , todos intimamente, pretendem, por caminhos diversos, sobreviver por aqui ,além da brevidade inevitável da vida. O empresário que constrói o arranha-céu, a grã-fina que compra a Hylux nova, o político que põe o próprio nome na rua recém construída , todos esforçam-se por saltar o caudaloso rio da morte e do esquecimento. Algumas vezes se utilizam até estratagemas terríveis: matam-se pessoas famosas, empreendem-se chacinas e guerras genocidas, no intuito de imprimir o nome no livro da história, mesmo que seja na página policial. Há em todos a vã esperança que será possível vencer e morte física através de nossos atos . Nosso pretensão não é muito diferente do faraó que construía a pirâmide e se acercava de todos seus utensílios terrenos, na certeza de que no outro mundo teria uma vida muito parecida com a que levou aqui embaixo.
O certo é que todos grafamos, cada um a seu modo, nossos pictogramas no paredão do nossa época.Alguns destes desenhos, como os da Gruta do Sol, resistirão aos anos e às intempéries, mas apenas legarão à posteridade vagas informações daquilo que um dia fomos e pensamos. Nossa individualidade esfumaça-se com a nossa partida. Podem ficar alguns poucos indícios do crime perpetrado, mas, no final a morte sempre ganha a questão e o esquecimento será sempre o desenho derradeiro que ficará aposto na gruta da vida , sempre esmaecido diuturnamente pelo apagador do tempo que prepara o quadro para ser pintado pelas gerações vindouras...

J. Flávio

Ex-impromptu



de onde vem este escolho
entre a mão e o olho?

por que tão rápida a hora
do aqui e agora?

entre o querer e o fazer
cabem quantos talvez?

ah, a bela imediatez

José Paulo Paes

MOTO CONTÍNUO

COM A
PRÁTICA

A PERFEIÇÃO
VEM POR

INÉRCIA

"COGITO ERGO SUN"

PENSO, LOGO...
SOU.
(literalmente e literariamente)

se penso que sou,
sou,
se não penso ,
não sou...

(se)
penso Bem

penso sem amarras
dez amarras desamarram...

penso AMAR
dez armas
se desarmam

pense também!
pense bem!!


sexta-feira, 27 de julho de 2007

Eu e a Revolução (10 anos que Science resolveu voar)




Não sei se as revoluções têm características particulares. Algo que faça alguns de nós – por acaso ou mérito, tanto faz – sentirem que elas estão por vir. Sei lá. Uma evidência qualquer, uma sutil demonstração de que as coisas estão para mudar.
Mesmo quando mais novo, nunca fui o melhor dos sujeitos pra sacar que algo novo tava pintando. Acho que tem a ver com o fato de ser excessivamente crítico e carregar um outro tanto de descrença. Coisas de quem lê demais, quem sabe. Ou coisas de quem lê os livros errados.Era, como vários caras de minha idade, contrário a tudo. Lutava contra o que quer que fosse óbvio – uma obviedade numa época de equívocos e outras descobertas. Qualquer leve suspeita e caminhávamos resolutos na direção inversa. E lá íamos nós de cabelos longos, com camisas pretas num sol de rachar. Buscando um novo riff ou um novo som - mesmo que estes estivessem sido inventados lá nos setenta; contanto que fosse de fora. Isso causava um tipo de cegueira que carrego até hoje.
Naquela tarde a coisa não era lá muito promissora. Na verdade, o que me levou a ir até ali foi a mais pura preguiça. Um tipo de negligência em causa própria. O convite surgiu de um amigo, na casa do mesmo. A gente tentava decifrar uns solos do Hendrix – ou seria do Page? – enquanto rolava umas “outras ondas” naquela pequena sala de estar.
Ao menos havia o pôr-do-sol. Era bacana. Aliás, no Solar do Unhão, o sol era presença marcante. Não aquele tipo de sol chapado e cru. Tinha outras nuances, outras definições e cores. Estendido, gigante, imponente.
No anúncio recortado do jornal pelo meu amigo, o nome da banda nos fazia acreditar que era do estilo “regional” – entendam as aspas como algo que, na época, colocávamos no saco das coisas óbvias, comuns demais para nossos egos enfurecidos; nossa certeza de estarmos na contramão, num caminho certo. Alguns fios já estavam espalhados por onde seria o show. As pessoas, algumas pelo menos, pareciam ter as mesmas expectativas que nós dois. Mas era uma boa e preguiçosa tarde. E havia o sol, caso a coisa fosse excessivamente tediosa.
Quando a guitarra surgiu, toda suspeita de tédio, repetição ou obviedade desapareceu. Foi detonada, literalmente. O Chico, ele mesmo, com esse nome tão trivial, cantava coisas que até então eu não compreendia. Uns tambores enormes e pesados – estes com nomes menos triviais: alfaia - sacudiam e faziam ruir algumas velhas certezas. Elas quebravam, feito vidro vagabundo.
A gente se divertiu. Alguns que, assim como nós, chegaram desconfiados demais, curtiam e dançavam do jeito que lhes parecia melhor: o corpo respondendo ao som pesado, as surradas camisas pretas encharcadas de suor.
Era uma mudança. Que nos fez alterar o rumo das coisas. Fazer outras escolhas, ouvir outros sons; acertar nos livros e nos discos; sermos um pouco nós mesmos.
O nome é revolução. Mas você pode chamar também de Manguebit .
texto publicado também no overmundo
Atenção:
Nos links recomendados pela Cariricult, foi retificado o seguinte:
www.dominiopublico.gov.br : com obras consagradas de vários autores, teses e dissertações sobre os mais diversos temas,etc. Vale espiar!

MariaCafé



O Crato agora possui um ponto de encontro para happy hour. Lá no Mandacaru Center, no final da galeria, há o MariaCafé "o sabor da simplicidade" para um bom papo ao som de jazz, mpb e tutti quanti de excelências musicais. Lista dos "ilustres" frequentadores: Abidoral Jamacaru, Ulisses Germano, Lamar Oliveira, Zé Nilton, Jayro Starkey.. Falta você chegar lá. Vale a pena conferir o MariaCafé, uma simpatia de lugar - bem transado e muito cult! A organização do novo espaço 'tá por conta dos publicitários Greg & Sabrina Souli, e do fotógrafo cratense Netto Castro.

MariaCafé
o sabor da simplicidade

Mandacaru Center, loja 9
Rua Dr. Miguel Lima Verde, 494 - Centro (Crato)

quinta-feira, 26 de julho de 2007

foto de frente para meu perfil!


Esta foto se faz necessária para a sua inclusão no meu perfil de colaborador. Desculpem pela beleza (risos)!

Clara Clarice !

Vezes enviezada
Vezes obscura
Vezes doce, vezes amara
Clara Clarice, clara

A Rapaziada que Virou Tese




O livro Contracultura, Tradição e Oralidade – (re)inventando o sertão nordestino na década de 70, de autoria de Roberto Marques foi, originalmente, apresentado como dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal da Paraíba-UFPB, em junho de 2001. O texto foi publicado em formato de livro pela Annablume Editora, de São Paulo, em 2004.
Ao tempo em que apresenta os movimentos culturais das décadas de 70 e início de 80 na região do Cariri cearense, o livro discute o conceito de memória como importante instrumento para se compreender a modernização em áreas periféricas da produção cultural no Brasil contemporâneo.
O autor é psicólogo pela Universidade Federal do Ceará-UFC e mestre em sociologia pela UFPB. É professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Regional do Cariri-URCA. Atualmente, cursa doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ.
Sobre a obra, de acordo com Marieta de Moraes Ferreira, prefaciadora do livro, “o autor tem como ponto de partida a atuação do Instituto Cultural do Cariri-ICC, na década de 50, cuja produção intelectual se preocupava em estabelecer uma ligação importante entre os fundadores do Crato e a geração de intelectuais que, nos anos 50, portavam um projeto civilizador para a região do Cariri”. No entanto, em contraste com a geração de 50, reunida em torno do ICC, o autor enfoca a atuação da chamada “geração 70”, cujas motivações na construção da memória local se diferenciavam radicalmente.
Assim, através de entrevistas com representantes daquela geração, dentre os quais Luíz Carlos Salatiel, Abidoral Jamacaru, José Nilton de Figueiredo e Jackson “Bola” Bantim, além de pesquisa feita nas publicações que eram porta-vozes dessa rapaziada, como os jornais Nação Cariri e Folha de Piqui,- o autor reconstrói um interessante cenário onde é possível vislumbrar como se desenvolveu no Cariri um dos mais efervescentes movimentos de resistência cultural e de contracultura do Brasil profundo.

pedido aos manos músicos: salatiel, rafael, ígor, calazans, manel de jardim, joão do crato, dihelson...


Canção de luana

Ela aprendeu a rir
Antes de falar, e nunca soube separar
Falar de rir. E ela ri falando
E ela fala rindo, só rindo indo,
Lindo passarinho, da lua emana
Luana, luana, feita de sonho e doçe de banana

Ela trouxe a cor
Do chocolate na pele, e nunca soube ver na cor
Um traço que separe, e ela pinta o sete,
E o sete vira nove, e tudo é sempre único, arco íris
Que brilha em cima de uma cabana
Linda cor de luana, do sol emana
Luana, luana, feita de cor de doçe que não engana

Ela cresçe devagarinho
E pede asas aos seus anjinhos
Um pouco mais de risad
Um pouco mais de cor flambada
Pra encantar, cada canto que passa
Pra brilhar, os olhos de quem lhe ama
Luana, luana, feita de chuva e de vento
Que lhe assanha os cabelos e lhe abana
Luana, luana, luana lua na luana.


Minha filha miúda me deu uma tarefa difícil... fazer uma música – já que sua irmã, luisa, herdou a de tom jobim “vem cá luisa, me dá tua mão...” – complicado tentar entrar na seara do maestro tom. Bom, faço meu pedido aos camaradas: Alguém se habilita? A letra não é um “tratado”, mas é absolutamente verdadeira. Desde já, agradeço as tentativas. Hasta la vista.

Light and Shadow - A música interior que habita todas as coisas...



"Fazer Música é Traduzir o universo!

A Música como forma de expressão, é uma dádiva. Algumas pessoas nascem com o dom de perceber essa essência, outras nem tanto. Mas podem desenvolver habilidades e trabalhar essa percepção. A Música verdadeira, é espiritual. Para ser um bom músico, é preciso olhar para dentro de si, encontrar-se, e descobrir a realidade cósmica. Fazer música, é conversar na linguagem de Deus!

A verdadeira MÚSICA em maiúsculo é a mais alta expressão da arte sublime, a única coisa que não segue o padrão de representação, e sim, a própria "vontade", que seria a essência de tudo, segundo Schoppenhauer. Infelizmente, poucos privilegiados conseguem entender e captar a verdadeira essência da música. Ela não está nem na técnica, nem nos livros. A música de verdade está em toda parte. Ela é a própria vibração do universo, e que une tudo e todos. Os livros e a escola representam apenas a codificação do universo musical perceptível, palpável, técnico, que pode ser posto em papel ou outra mídia. É o topo do Iceberg, quando a grande imensidão da música não se encontra em papel algum. O músico trabalha com formas abstratas. Tudo pode ser música, nas mãos hábeis daqueles que aprenderam a conversar com o universo.

Aqui na terra, nós músicos somos sacerdotes, mediadores que apenas canalizam essa informação. Os músicos, visionários, conseguem enxergar as formas abstratas mais puras de um determinado padrão universal e apresentá-la de modo que outros possam ver o que o artista vê. Sentir o que o artista sente. É preciso que haja um despertar espiritual pleno, gradativo e inexorável para se compreender a música em sua plenitude e ver que ela é bem mais que o creme, a cobertura, que é aquilo que alguns têm feito até então.

Enquanto o artista não desperta para essa realidade interior, se descobre, e traduz o universo e a sua essência, ele será um impostor, um míope que enxerga formas incompletas e imperfeitas. Sua música não representa ainda a forma perfeita da idéia. Por isso, somente uma profunda introspecção e observação precisa e direcionada faz com que seja possível a descoberta das formas ideais e puras.

Tocar em grupo, é comungar espiritualmente, é partilhar energia. É conversar na própria linguagem do espírito.E quando esses espíritos se tornam vasos comunicantes, a energia flui e a música verdadeira acontece. "

Dihelson Mendonça
21/03/2007

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Ana Cristina Cesar - A Teus Pés


Uma geração barulhenta a minha - meio que crescido num tumulto chamado década de 90. A ana veio antes. E foi antes também.

Mulheres, me acudam!


Atenção todas a todas as mulheres do mundo! Se quiserem participar como colaboradoras desta revista eletrônica CaririCult, mande e-mail direto para o administrador do blog: lcsalatiel@hotmail.com, dizendo qual área é do seu interesse (poesia, teatro, cinema, música, dança, etc e tal).

PS: Ok, Amanda!

Só no Crato Mesmo...


Ararinha Azul

Representante comercial das famosas malas Sunderline, Garibaldo nunca tinha andado pelas bandas do Cariri. Trabalhara sempre na região norte do estado , onde, segundo afirmava categoricamente, seus malotes se conheciam até em Frecheirinha.A firma resolvera, ultimamente, explorar outros rincões do Ceará e convocará um Garibaldo pouco estimulado a se mandar para estas brenhas. Uma terra onde o povo só usa aribé, arupemba, matulão e balaio, como diabos vou conseguir vender as requintadas bolsas Sunderline ? --- Pensou Garibaldo com seus botões. Funcionário, no entanto, não tem querer, chefe é chefe e, com as duas únicas opções à sua frente : a rua ou o Cariri, terminou preferindo a última.
Chegou por aqui na penúltima segunda-feira, aproveitando o espírito natalino e suas desbragadas leis de consumo. Informara-se ainda em Fortaleza sobre um motorista local que o pudesse acompanhar na peregrinação pelas cidades caririenses. Houve quase que um consenso entre os muitos representantes conhecidos entrevistados: Bosquim. O homem, dizia-se, mostrava-se algumas vezes um pouco sincero demais, mais positivo que Augusto Compte, mas dirigia como ninguém: cuidado extremo, senso de responsabilidade e mais de quarenta anos de estrada, sem uma derrapada qualquer , nem mesmo uma freada mais brusca. Garibaldo , mal chegou na rodoviária, já despistou os taxistas de plantão e ligou para o celular de Bosquim que o atendeu prontamente. Passaram toda a semana juntos, percorrendo as cidades maiores do Crajubar. As vendas até que surpreenderam Garibaldo que previra, erroneamente, retornar à capital com uma mão no cano e outra no feixe. Tantos dias próximos, aos poucos se foram quebrando as arestas entre o representante e o motorista. Se foi tecendo uma amizade e a intimidade trouxe consigo troca de confidências. Garibaldo segregou para Bosquim que do alto dos seus trinta e seis anos ainda não contraíra casamento. Não porque não desejasse, mas não havia ainda encontrado a outra banda da maçã. Confirmou sua caretice, ligado demais à família, procurava uma moça boa, de mesa e cama e, antes de tudo casta . Lembrou que na capital virgem era espécie praticamente em extinção e que já estava sendo cadastrada pelo IBAMA, como a Ararinha Azul. Bosquim, por sua vez, lembrou que no interior a coisa andava também bastante preta, mas ainda havia lá muitas honrosas exceções e que certamente ele, com tantos critérios, deveria preferir procurar por aqui a outra banda do araticum, se não quisesse ser corno na folha.
Na sexta-feira, descendo a Avenida Duque de Caxias aqui em Crato, na companhia do motorista, Garibaldo avistou uma imagem que só podia vir do paraíso. Uma morena alta de cabelos lisos, recortada como um violoncelo, com uns olhos recortados , semi-orientais e uma boca carnuda como se eternamente estivesse buscando beijo. O representante, imediatamente, interrogou Bosquim sobre aquela aparição. De que éden escapara aquela ninfa ? O motorista , rápido, puxou a ficha da deusa: morava no centro, estudava na URCA e, ao que sabia na possuía namorado, quando não estava estudando, residia na igreja praticamente: rezando e debulhando terço. Garibaldo,fatalista, súbito, acreditou que aquilo só podia se tratar de uma coisa do destino que sempre escrevia linheiro com a caneta torta. Suplicou a Bosquim que pegasse dados da moça, conseguiu o celular, ligou para ela e, apesar da relutância, conseguiu marcar um encontro ali na Choupanna à noite.
Chegou todo fiota, entabulou conversa e o interesse pareceu mútuo. As mulheres daqui gostam muito dos homens forasteiros, um pouco pela novidade, pelo mistério, mas também por que não sendo daqui retornam, não têm muito a quem contar as intimidades e diminui bastante o perigo dos segredos de alcova serem divulgados no patamar da igreja da Sé.
A moça desde o primeiro contato pareceu-lhe extremamente recatada. Só no segundo encontro conseguiu pegar na mão, o primeiro beijo foi roubado, com alguma dificuldade no quarto dia , quando a pediu em casamento. Entabulado o enlace futuro , conseguiu , com enorme dificuldade , leva-lá a um Motel.A moça entrou temerosa e preocupada, no quartinho. Garibaldo, para tranqüiliza-la, abriu uma cerveja, deixou todo o ambiente a media luz, colocou uma destas canções de Roberto Carlos que faz uma música para o motel e depois outra pedindo perdão a Jesus Cristo.Começou as preliminares com cuidados de quem toca harpa. Nisto lembrou a necessidade de carregar o celular já que tinha que se comunicar com seu chefe ainda naquela noite, depois da lua de mel. Partiu para conectar o carregador na tomada mais próxima, quando tomou uma descarga de alta tensão ao ouvir estas recomendações da futura esposa :
--- Ei, meu filho ! Pelo amor de Deus! Não mexa nesta tomada aí não que ela ta dando um choque danado !

J. Flávio





quando eu tiver setenta anos

então vai acabar esta minha adolescência

vou largar da vida louca

e terminar minha livre docência

vou fazer o que meu pai quer

começar a vida com passo perfeito

vou fazer o que minha mãe deseja

aproveitar as oportunidades

de virar um pilar da sociedade

e terminar meu curso de direito

então ver tudo em sã consciência

quando acabar esta adolescência

p. leminsky

ExpoCrato termina, deixando um rastro de destruição cultural na região...


E pensar que ainda veríamos um mundo onde o ser humano pudesse evoluir mentalmente...vemos, pelo contrário com profundo pesar um grande Cartel formado pela mídia, proprietários de bandas de Forró ridículas, e promotores de eventos, bandas ou bundas essas, cujas letras são uma afronta à inteligência humana, degradam a mulher, e valorizam o alcoolismo, o ser perdido, raparigueiro, violento, que não se adapta a uma vida civilizada, desrespeitando toda forma de convivência em sociedade, com som astronomicamente elevado, invadindo as residências, poluindo o meio-ambiente com ondas sonoras de frequências ultra graves ( sub-woofers ), levando jovens ao alcoolismo e à prostituição, e toda essa estrutura sendo apoiada por locutores de rádio burros, que, sem formação cultural alguma, se preocupam tão simplesmente em falar CARIOQUÊS... sem nada na cabeça! A era dos DJs, onde a arte é decadente, corrói as mentes das nossas crianças. Quando vemos crianças de 8 anos de idade, sem qualquer formação, mas já cantando músicas de "solteirões do forró" e "aviões do forró" nos dá pena! E que dizer dos professores rejeitados nas escolas pelos alunos ao tentar colocar uma letra de Chico Buarque para análise, ao receberem dos seus alunos: "Professora, isso é música de velho! porque você não coloca uma música de "aviões" ? Essa música aí nunca se ouviu nem no rádio. Ah, RÁDIO, essa é a palavra mágica para todas as questões. No Crato, o rádio é a maior prova da decadência da cultura e das Artes em geral. Como inverter esse quadro ??

Reflexões sobre a Ineficácia do modelo cultural do SESC/ BNB frente à Mídia

Olá, Amigos,

Esta é uma mensagem de reflexão sobre a eficácia/ineficácia dos métodos usados para divulgação cultural por parte do BNB, SESC e algumas secretarias de cultura.
Desejo de antemão parabenizar todas essas entidades, que fazem um trabalho único em prol de uma sociedade pensante e de divulgação cultural.

Como é sabido por muitos, o Banco do Nordeste do Brasil, através dos seus Centros Culturais têm promovido ao longo de muitos anos, excelentes shows e eventos culturais simplesmente magníficos. Bem como o SESC, a Secult, e alguns mais.
Por exemplo, estou acompanhando ativamente o II Festival BNB da Música Instrumental, um evento gigantesco, que reúne simplesmente "a nata" da música instrumental do Nordeste. O Sesc também tem se empenhado ativamente em uma interminável série de eventos culturais.

Minha preocupação e meu alerta é que, como observador do "modus operandi" da mídia e seus comparsas, o método de divulgação cultural empregado pelo BNB, SESC e afins é quase que totalmente ineficaz, senão vejamos:

Em Crato, terminou hoje, a famosa EXPOCRATO, evento anual promovido pela prefeitura Municipal e apoiado pela iniciativa privada que toma conta do setor de shows. Aconteceu este ano que o II Festival BNB de música instrumental coincidiu com a Expocrato.

Aconteceu que a iniciativa privada criou uma grande campanha na mídia para divulgar seu evento, e os shows terríveis de bandas de forrró podres, se realizaram, como em todos os anos anteriores, em palcos enormes ao ar livre, onde a população pode ter acesso. Estima-se que a cada noite, cerca de 30.000 a 50.000 pessoas tiveram contato, e foram levados a conhecer, incentivados a gostar e passar a ser apreciador da degradação cultural que foi divulgada, promovida e incentivada pela ExpoCrato.

Metodologia diferente dos eventos do Sesc e BNB, onde os shows aconteceram em ambientes fechados, onde 40 ou 50 pessoas ( por show ) assistiram aos eventos.

Ou seja, eu acho que estamos perdendo a batalha, não por falta de boa vontade nem de investimento, mas de metodologia. Precisamos urgentemente rever esses conceitos e métodos.
De que adianta promover um mega-evento desses, caro, pagar bem aos músicos e quase ninguém comparecer?

"De que adianta acender uma lâmpada e escondê-la debaixo de uma cama?"

Porque se sabe que ao se criar uma sala de espetáculos e anunciar que ali vai haver um Concerto, só vai a esse evento quem já gosta desse tipo de música. Dizendo diferentemente, só vai assistir aos eventos do BNB e do SESC, as pessoas que já gostam desses estilos, ou os amigos dos executantes. Talvez, raramente , uma pessoa aqui e acolá passem por curiosidade para ver o que está havendo ali...

Será que não seria mais interessante que o BNB, o SESC e a SECULT promovessem certos tipos de eventos ao Ar livre onde a população , a MASSA pudesse ver e assimilar ?

Que tal se o BNB se associasse aos governos municipais a fim de realizar parcerias sempre visando grandes espetáculos ao ar livre? Já que Maomé não vai à montanha, que a montanha vá a Maomé !!!

Já imaginou se esse festival de música instrumental fosse realizado em uma Mega-estrutura ao Ar livre em cooperação com o poder municipal ? Quantas pessoas veriam o evento? 30, 40 , 60 como hoje ??
Não, eu lhes digo, levaríamos 10.000, 20.000 ou mais pessoas , se também investíssemos na mídia em publicidade!
Um dos fatores mais importantes no processo de aculturação é o tempo de exposição.
Por exemplo, porque somente aproximadamente 3 a 5% da população gosta de Jazz e de música Clássica?
Porque elas não tem acesso a esse tipo de música. Nem o rádio nem a TV tocam esse tipo de música.
Então, como as pessoas irão gostar de uma coisa que nunca ouviram ?
Eu não posso culpar as pessoas por gostarem de Bruno e Marrone nem de Aviões do Forró, porque é somente isso que eles estão recebendo! Eles não conhecem outra coisa. E as entidades que deveriam fazê-las conhecer outras realidades, estão elitizadas, certas pessoas tem até medo e vergonha de entrar num auditório para ver um show de arte.

Sempre me vem a preocupação de que a maioria das pessoas não está sabendo do que acontece dentro dos auditórios do BNB.
Tenho procurado através de meus vários websites, divulgar, convidar pessoas a comparecerem aos eventos do BNB, mas isso ainda não é suficiente.

Há muito tempo, alguém suficientemente inteligente, descobriu que o método de divulgação boca a boca não era muito eficaz e para isso inventou a IMPRENSA.
Há muito tempo, a indústria da mediocridade, que propaga a degradação da arte observou que haveria de fazer parceria com a MÍDIA.

Pois é tempo de acordarmos e assimilar esses métodos.
É interessante como se pode aprender com as táticas do inimigo.
É interessante observar como o "SomZoom" soube inteligentemente investir num satélite para propagar o seu madito forró para os 4 cantos do Brasil.

Quem tem a mídia tem o poder. E quem tem a mídia É o poder.
Vejam vocês quem são os proprietários das estações de rádio do Brasil? Os políticos.

Então, eu acho que é tempo de criarmos o que eu chamo de "A CORRENTE DO BEM", onde Artistas, produtores, autoridades esclarecidas, pessoas de bem em geral, possam se integrar a esse grande movimento, procurar soluções mais eficazes para contra-atacar a ignorância que vem ganhando terreno nessa luta desigual.

Não devemos nos confinar aos gabinetes, nem aos auditórios.
Imensas somas são gastas ineficazmente, ou elitisticamente, quando poderíamos ganhar as ruas e conquistar mais pessoas.

-> A não ser que eu esteja enganado, e o propósito seja a manutenção de uma cultura elitista!

Devemos arrumar formas de ganhar as ruas.
A Arte e a Cultura PRECISAM URGENTEMENTE sair de dentro das 4 paredes dos auditórios e passar a se apresentar em praças públicas, onde aí sim, levaremos cultura ao camponês, aos jovens, e à todas as pessoas que ainda não foram consumidas inteiramente pela indústria da mediocridade.

Os eventos do BNB e SESC são magníficos e mais e mais pessoas precisam conhecer e apreciar!
Levemos os artistas aonde o povo está. Na praça!
Ou aceitemos que essa guerra já está perdida!

Pensemos com carinho acerca desses dados preocupantes, e que me chega a tirar o sono!
Aguardo comentários.

Este e-mail está sendo enviado a mais de 1.000 endereços.

Dihelson Mendonça

http://www.portaldojazz.com/
http://www.vivacebr.com/
http://www.radiopiano.com/
http://www.dihelson.com/
http://www.portaldocrato.com/

De comentários e de mulheres!


Atenção leitores e colaboradores da Cariricult! Vocês estão lendo os comentários postados?Comecem a ler com urgência. Me vem assim na cabeça como se fosse o lado B da nossa revista: cheio de preciosidades. Falo sério. Uma maravilha! Por falar em maravilha, aqui vai um recado curto, direto e certeiro: Quero mulheres nas nossas páginas. Tragam mulheres para a Cariricult. Que desnudem suas almas aqui.

terça-feira, 24 de julho de 2007

Eternamente Clarice!


Não fique aí parado.


No Centro Cultural Banco do Nordeste Cariri:

QUARTA, 25 DE JULHO
18:30 Quinteto Brassiliando (PB)
20:00 Timbral (CE)
QUINTA, 26 DE JULHO
18:30 Orquestra de Rabecas Cego Oliveira (CE)
20:00 Marquinhos do Sax (CE)SEXTA,
27 DE JULHO
18:30 Duo Pianíssimo (CE)
20:00 Luciano Magno (PE)
SÁBADO, 28 DE JULHO 18:30
Luciano Brayner (CE)
20:00 Treminhão (PE)

Entrada gratuita. Venha conferir!

Não arrebentem meus tímpanos



Numa cidade do interior de Pernambuco, um homem matou três pessoas. Os homicídios são comuns no Brasil, estamos em primeiro lugar no mundo nesse item. O que não é comum é o motivo dos assassinatos. Ao ser preso, ele declarou ter matado a mulher e seus dois filhos porque não suportava o barulho que faziam em casa. Os vizinhos evangélicos passavam o dia com o som ligado no mais alto volume, escutando hinos em louvor a Jesus.
O criminoso será julgado por triplo homicídio. Desconheço se a agressão sonora que ele sofria servirá de atenuante. Provavelmente não. No Brasil, quase não existem leis sobre o controle de emissão sonora. Qualquer pessoa pode abrir um boteco junto de sua casa, ligar um som nas alturas, varando dias, noites e madrugadas. A vítima não encontra a quem se queixar, e quando o faz, as chances de resolver o problema são remotas.
Dizem que a cidade mais barulhenta do mundo é a do Cairo. Eu não posso dizer que sim, porque nunca fui lá. Mas conheço cidades brasileiras, pequenas e grandes, e poucas se destacam pelo silêncio, sobretudo no Nordeste. Todos se acham no direito de falar alto, ligar o som do carro no meio da rua, fazer publicidade em carros de som, manter televisões ligadas nos restaurantes, batucar em qualquer esquina. É um desrespeito. A facilidade de compra de aparelhos sonoros transformou as pessoas em agressores potenciais. O barulho na casa do seu vizinho é uma arma apontada contra os seus nervos.
No romance O Estrangeiro, do escritor argelino Albert Camus, o personagem Meursault comete um assassinato. Quando lhe perguntam por que matou, ele responde que por causa do sol forte. O assassino de Pernambuco atribuiu seu impulso ao descontrole nervoso, causado pelo som alto que escutava dias seguidos, sem desejar. Camus era um existencialista e escrevia sobre coisas absurdas. O assassino é um brasileiro que vive num país absurdo, onde as leis ou não existem ou não são respeitadas.
Falam que a emissão de ruídos por um trio elétrico, aquela fábrica de loucos inventada na Bahia, não pode ultrapassar a altura de tantos decibéis. Nunca ouvi falar de fiscais medindo em aparelhos o volume sonoro produzido. E se o trio de Ivete Sangalo estiver muito acima do que a lei determina? Será que vão mandar a baiana descer do carro e parar a geringonça? Duvido. No máximo aplicarão uma multa irrisória, que não será paga.
O presidente Lula reclama porque ninguém fala bem do Brasil. Falar bem de quê? Dos atrasos nos aeroportos? Das falcatruas de Renan Calheiros? Essa campanhazinha para que se enalteça o Brasil até me lembra a velha campanha da ditadura, quando cunharam o slogan "Brasil: ame-o ou deixe-o". Um gaiato sugeriu que o último a sair apagasse as luzes do aeroporto.
Não existe muito a quê fazer elogios, nem dá para relaxar e gozar como sugere a ministra sexóloga. Os múltiplos chiados não permitem. Desesperado, sem amparo da lei, sem saber a quem reclamar, o homem incomodado pelo volume alto de um som, atirou e matou três pessoas.
Seu ato será classificado como individualista. As ações individuais são freqüentes nos países onde não existe respeito ao coletivo. Desde a nossa colonização, construímos uma sociedade em que prevalecem os valores individuais, a competição e a rivalidade. A associação e o respeito ao direito do outro não fazem parte do caráter nacional. Basta olhar para os nossos políticos e comprovar o que escrevo. Corrupção e impunidade também são formas de assassinato. É igual ao som alto que rasga nossos tímpanos e nos enlouquece até o impulso de matar.

Ronaldo Correia de Brito ,Cratense/Recifense , é médico e escritor.

Escreveu Faca e Livro dos Homens.

Assina coluna na revista Continente

e no Site Terra Magazine

um bom mano baiano, kariri de coração, disse isso no blog (ducaralho) cozinha do cão.

Cariri
Eu tinha um ar febril naquele dia. Mas nada que tivesse relação com algum tipo de inspiradora necessidade; aquela sacação de última hora, um por do sol do caralho em minha frente e eu perdendo as estribeiras.
Era febre mesmo. Quarenta graus.
Uma porra de um dente que resolveu se deteriorar mais ainda. E me causou uma dor horrenda, um puta abcesso. Há noites não dormia. Minha cara tava gigante; os olhos vermelhos e chumbados.
O consultório ficava num “centro comercial” pequeno, bem ao lado da velha igreja de Juazeiro da Bahia. Uns corredores estreitos estavam tomados de óticas, escritórios de contabilidade, médicos e algumas outras salas com profissionais de procedência pra lá de duvidosa – umas cartomantes e um tarólogo. E a tal dentista, que não estava lá.
Eu tava fodido. Não tinha o que fazer a não ser esperar. Isso significava mais sofrimento. E o incômodo de andar por ali com a cara inchada literalmente.
O que me restava era caminhar. Esperar a tal doutora. Foi então que eu me deparei com uma salinha minúscula. Ela destoava do resto cinzento, abafado, monótono.
Na porta, um pôster do Jim Morrison: os olhos do Xamã talhavam o ambiente carregado de tédio. Numa velha vitrola – daquelas que usavam pilhas – o Raul dava o toque. Dentro, livros. Muitos livros.
Como quem não quer nada, entrei. Ressabiado, duvidoso e desconfiado. Um leve e quase imperceptível cheiro de mofo tomava o lugar; os livros do Bakunin, do Rilke, dos beats, do Suassuna, arrumados em ordem alfabética; as revistas Animal numa cesta, jogadas; exalavam aquele ar característico de sebo.
Numa mesa do centro, o Hélio lia algo. E ele me recepcionou, numa boa.
Foi o começo.
Foi ali que eu vi o que iria dar uma guinada em minha vida – até então, algo morno e ensimesmado; mas já dava seus primeiros toques de ressurgimento. Uma revoada.
Eram os fanzines. Mas especificamente um: Séquiço Sacro era seu nome.
Era uma literatura feita na raça. Antes dessa onda “on line” – que também é do caralho, mas nos facilita a vida e amolece demais as coisas -, o que esses caras faziam era pela mais pura vontade de gritar. Mostrar ao mundo que havia vida furiosa e inteligente além dos formalismos boçais dos circuitos literários e dos sarauzinhos de merda. Eles digitavam os textos em velhas máquinas Olivetti e cortavam seus fragmentos de vida junto com recortes de jornais, quadrinhos, desenhos, ondas.
Eu lembro nitidamente das colagens. Lembro dos poemas do Uberdã, das ondas do Rafael Fel; dos toques curtos e certeiros do Kleber Matos e da incendiária poesia do Lupeu Lacerda.
Dali eu passei a conhecer um lado mais divertido do mundo. Sem eles, acho que seria mais um adorador do Augusto dos Anjos e estaria até hoje caminhando com roupas pretas e com um olharzinho tristonho.
Eu vi as mulheres de bunda grande que o Robert Crumb desenhava; as boas vindas de um texto do Murilo Mendes – pois entre os inéditos, referências a alguns dos primeiros a escancarar as portas da poesia feia com algum culhão. Entendi, de uma vez por todas, que escrever era algo que podia andar lado a lado com a vida.
Minhas velhas crenças foram para puta que pariu; prum ralo qualquer, que não me faz falta.
E eis que eles voltaram num blog pra lá de bacana. Hiperbólico, sempre atolado de coisas que valem a pena sacar. O CaririCult nada mais é que uma versão melhorada; a loucura finalmente “on line”.
Eles podem se dar ao luxo de citar ao Hilda Hilst e falar de cubanas lindas que desfilam em festas nacionais dos charutos Havana. Podem copiar textos sobre literatura, catar fotos em outros lugares, numa pirataria lúdica.
Eles podem até citar o Whitmam, numa boa.
Eu até que poderia fingir que não era comigo. E nada escrever. Mas acho foda ter esses sujeitos que me abriram algumas portas – capitaneados pelo Lupeu, o único do grupo com quem consegui dividir algumas cervejas, cigarros, noites alucinadas e outras ondas nem tão corretas assim – aqui e não deixar claro de onde vieram minhas influências primárias; eles deram o chute na porta.
Depois disso, as cervejas se tornaram mais companheiras, os vinhos Dom Bosco se tornaram algum tipo de abençoada bebida e os livros foram devorados com legítima vontade de mudar o rumo das coisas.
Postado por Gustavo Rios (gustavosilvassa@gmail.com)

Achados e Perdidos


Ultrapassando o Cabo das Tormentas por volta dos cinqüenta , nos pomos, continuamente a fazer balanço da vida. É que , à frente, se vai estreitando o caminho e começam a faltar, seguidamente, colegas de classe na hora da chamada.As coisas passadas vão pouco a pouco se tornando mais presentes e mais vívidas. Até porque nos vamos dando conta de que a juventude ,com seu séqüito de leveza, de descompromisso, com os frutos da esperança, languidamente, se oferecendo no nosso pomar terá sido a mais dourada fase da nossa existência. Com os anos, nos vamos cobrindo de um sem número de responsabilidades e compromissos . Passamos a carregar um fardo cada vez mais pesado : vivemos apenas nos interlúdios e sorrimos nas entrelinhas. A vida é isto mesmo: um curta-metragem e nem sempre de animação.
Um dia empreenderemos a viagem final para o desconhecido. Os místicos e os espiritualistas esperam na estação, sem muita ansiedade e angústia. Perpassa em todos, no entanto, laivos de um temor instintivo primal e incontrolável: “Ser ou não ser: eis a questão!” Quem sabe, por isto mesmo, viajar seja para todos um deleite. Viajar é uma espécie de morte reversível, a possibilidade de desvendarmos o desconhecido com passagem de volta no bolso. Loucos empreendem viagens psicodélicas( nem sempre com retorno garantido) na tentativa de descerrar a cortina e conhecer o outro lado da névoa. Os mais pragmáticos pegam veículos mais concretos e seguros em busca de outras paragens.
O certo é que, quando arrumamos os teréns e ganhamos o mundo, percorremos sempre duas estradas. Uma mais palpável e visível que se abre à nossa frente e que nos descortina novas paisagens, novas perspectivas e novos costumes. Rapidamente saltamos das nossas vidinhas resumidas , sintéticas e cotidianas para a exuberância do universo com suas portas largas, suas infinitas verdades e suas veredas desconhecidas e incomensuráveis.Nesta nova dimensão, já não cabem nossas pequenezes, nossos juízos pré-formados, nossas certezas aparentemente sólidas e inabaláveis. Parece que ,de dentro do ovo, bicamos a casca e deixássemos entrar a luz que nos ilumina e revela novos ângulos e arestas da nossa existência. Descobrimos que a unicidade reside na diferença e que as nossas certezas são apenas pequenos ladrilhos que necessitam se juntar a uma infinidade de tantos outros para desvendar o quebra-cabeça da verdade.
A outra estrada, por outro lado, se estende para dentro de nós mesmos, já que toda viagem é uma busca , uma procura . É como se tentássemos descobrir, em meio a tantas perplexidades, nossa exata localização no universo.Qual nosso papel no enredo? Que máscaras precisarão ser desfraldadas para que possamos fitar a real compleição da nossa alma? Talvez , por isto mesmo, nos sintamos tão alegres e felizes tanto na ida para o desconhecido quanto na volta, para o aconchego das nossas casas. É que de repente percebemos que a história é mais importante que a geografia e que todas as estradas, por mais esburacadas e tortuosas que sejam, sempre terminam ali, na beirinha do nosso quintal.

J. Flávio


Recado de Leminsky para todos nós!

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Crato & Creta


Crato é Creta
Creta é Crato
A lua que lambe Creta
Alua os doidos do Crato
No palácio de Cnossos
Crato guarda os seus destroços
Não pense que é desacato

E que é coisa de cretino
Mas o mar que enrosca Creta
Explode nas fontes do Crato
Largue o ar aristocrático
Repare bem no retrato
Crato e Creta ,Creta e Crato
Moram na mesma cratera
Pense de forma concreta
Que Minos mata no Crato
O Minotauro de Creta ?
Vai ser o maior barato
Quando a espada discreta
Dilacerar do Nó Górdio
Que ata o Crato a Creta
Quem sabe o fio de Ariadne
Marque a passagem secreta
Último ato do Teatro:
Teseu reinventa Creta
E o Tesão refaz o Crato .

J Flávio

Das sombras para a luz!


Nós que vivemos aqui neste tão aclamado e idolatrado celeiro cultural chamado Cariri somos uns "pobres coitados" quando se trata de veicular as nossas produções artísticas e, reconhecidamente, não existe nenhuma política pública municipal que facilite o escoamento dessa nossa produção. Ai de nós se formos esperar por secretários de cultura! Além do mais, quando já não existe vontade alguma, os limites da burocracia, a falta de critério (ou excesso?) terminam por minar as nossas forças até beirarmos a desistência.
Então, devemos buscar alternativas para que os nossos "trabalhos" cheguem ao público. Daí é que veio a idéia do site, que transformei em blog, e apropridamente para os novos tempos, criamos esta nossa revista eletônica que denominei caririCult.
Esta idéia surgiu após a montagem feita pelo Dihelson Mendonça do Blogdocrato. Eu, o Reginaldo Farias (designer) e o Zé Flavio estivemos em dezembro (ou até antes disso) com o Dihelson e trocamos umas idéias e expressamos o nosso desejo de botar na web a CaririCult, uma vez que o blogdocrato tinha seu foco na cidade do Crato.
Algum tempo passado nada aconteceu.
Então, de "férias" no Rio, decidi montar o blog/revista a partir de modelos pesquisados na internet. Foi rápido prá caramba e deu certo!!! Numa única semana com ela (porque o blog é uma revista eletrônica)na web o que veiculamos já dá prá avaliar que a CaririCult é um sucesso e terá vida longa. Agora, precisamos divulgá-la!

Um grande abraço,
Luiz Carlos Salatiel



Cinema dos Cariris Novos

Aproveito para parabenizar ao Salatiel pela beleza e originalidade do CaririCult. E a gente se sente honrado em participar do diálogo com a maravilhosa pléiade de artistas e intelectuais que chegam para efervescer este blog.

Cá em Belo Horizonte - MG, divido com amigos a alegria de lançar o Cariri no 9º Festival Internacional de Curtas (
http://www.festivaldecurtasbh.com.br/). Nosso filme "Cerca" foi selecionado no evento, e vem despertando a atenção dos participantes e realizadores cá presentes para com o Sul cearense. A nova geração de cineastas concentrada em Crato, consolidada com a Associação de Audiovisual do Cariri - AAC (http://aacariri.blogspot.com/), tem tudo para lançar grandes vôos, é só o começo.

Logo mais nos meses de setembro, outubro e novembro, estaremos lançando no Centro Cultural Araripe (RFFSA-Crato), os Debates Imaginários, uma promoção da AAC e Grupo Imago-URCA. Serão uma série de colóquios sobre cultura e cinema, com destaque ao cine documental. Estaremos em tempo divulgando este evento para o "b-r-o-ó-bró"! Saludos de cinema!

DICA DE CINEMA: Modigliani!




Vi e gostei deste filme (já está nas locadoras do cariri) que traz Andy Garcia na pele do pintor italiano Amedeo Modigliani. É doloroso ver como a alma atormentada do artista - que cultiva um vício de ópio e alcool - tansforma sua vida numa tragédia familiar. O fato novo é que vemos no filme um Pablo Picasso mais excêntrico do que imaginávamos e é, no filme, o grande antagonista. A ação se passa na França no início do século passado.
O diretor tenta -e de certa maneira consegue- trazer para a película a mesma temperatura de cores que o artista utilizava nas suas obras.

Título original: Modigliani
Realização: Mick DavisIntérpretes: Andy Garcia, Elsa Zylberstein, Hippolyte Girardot, Omid Djalili, Eva Herzigova, Udo KierEstados Unidos/França/Alemanha/Itália/Roménia/Grã-Bretanha, 2005

domingo, 22 de julho de 2007

Craterdã




Geraldo Mérkur



Regente japonês, guardião do Japão. Saúde para o ocidente sorrir. Singelo. Festagrafável pelo oriente. E viva o charme do siamês telepático. Torquathermeto cabralclaro. Pequim dourada. Formosanjo Erda. Terra Virgem Constelaçante ou Constelação de Virgem. Brasil, agora! Arara polar e pingüim tropical. Samambaia e mambo e samba e rumba. E reze uma Ave-Maria ardente para Janis Joplin em novembro. As seis da tarde na hora do Ângelo. Na quinta ou na sexta. Ou na segunda. Sucesso Imortal do Espírito.

Nota: Texto de Geraldo Urano que, na época, meados de 1983, assinava Mérkur. Publicado na página 6 do primeiro número do Jornal Folha de Piqui. Ilustrado por Edelson Diniz.

coisas pra dividir com meus irmãos kariris


Por que os homens escrevem, contam, lêem, vêem, ouvem, encenam e filmam histórias? Que necessidade é esta que os impulsiona desde remotas eras, quando as ásperas paredes das cavernas constituíam a única superfície segura de escrita, de pictóricas formas? O filósofo espanhol Ortega y Gasset disse certa vez: "A nota mais trivial, porém ao mesmo tempo a mais importante da vida humana, é que o homem não tem outro remédio senão fazer alguma coisa para manter-se na existência. A vida nos é dada, visto que nós não a damos a nós mesmos, senão que nos encontramos nela de uma hora para outra e sem saber como". Na existência nos puseram e com ela e a ela devemos nos conformar, por mais infelizes que sejamos. Ou fazemos isso ou optamos pelo suicídio.Um dos "remédios", uma dessas "coisas" a fazer "para manter-se na existência" que não solicitamos e que custamos a absorver, é precisamente a ficção, essa irreprimível propensão humana a contar histórias, naturalmente uma defesa, ou mesmo um "drible", uma remediação por parte do indivíduo, que, tanto mais exilado quanto mais vive, é talvez filho do acaso. "Desde que nasci, ainda não despertei", brada Pio Baroja num dos seus contos, intuitivamente flagrado pela consciência do caráter absurdo da existência humana, que, exatamente por se assemelhar a uma dádiva para a qual o homem não estava preparado, é melhor aceita se tomada por um longo sonho cujo despertar é a morte.
Este drible do indivíduo sobre a existência concretiza-se mediante o desejo comum a todos os homens de viver outras vidas. É uma concessão que se permite a cada nova história, nova aventura. Uma só vida, num único corpo, é pouco para o homem. Mais que prisão, significa dor, impotência. Logo, ao menos em imaginação, ele precisa sofrer sua metamorfose. É o que lhe sobra, pois tudo o mais é mistério. O Dom Quixote, de Cervantes, cuja primeira parte veio a público em 1605, já constitui, com larga antecipação e alta carga de ironia, uma expressão desse desejo humano: de tanto ler histórias de cavalaria, um homem se presume também um cavaleiro e sai em busca de aventuras. Torna-se outro em vida. Confere a si mesmo outra existência, possível para todos, mas improvável para a grande maioria dos homens, confinados que estão aos seus afazeres diários, à própria necessidade de viver ou, em alguns casos, de sobreviver.
A mais exata manifestação narrativa de nosso tempo, o cinema, que instaura o outro em sua forma mais viva, quase sem diferenças, não se furta nunca a essa vontade. Pelo contrário, sempre a tem em vista. Quanto mais realista um filme, mais nos sentimos dentro dele, a viver, muito próximos da plenitude e da verdade, a aventura que move aquelas pessoas resumidas a movimento e luz. Através do cinema, portanto, tornamo-nos muitos seres em uma única vida apenas, que é a nossa e que só a custo arrastamos, pois viver, se pararmos para pensar profundamente no assunto, por um minuto que seja, é insólito, sem sentido, se não um peso excessivo, uma punição, um confinamento. Mas, se quisermos, poderemos nos tornar trezentos, três mil! É o que acontece, a cada novo filme: variamo-nos, ficcionalizamo-nos. O filósofo francês Clément Rosset define o cinema mais ou menos sob essa perspectiva: "Por estar tão próxima do real, a imagem cinematográfica faz com que vejamos um outro que é quase o mesmo. Na sala de projeção não abandonamos o mundo; estamos quase num universo diferente, que se encontra, porém, no nosso espaço-tempo. Há uma magia propriamente real neste passeio sem custos". O cinema permite, portanto, a instauração do outro, que, no entanto, não deixa de ser o mesmo, de continuar a vida, a humana vida.
Um representativo exemplo literário de fixação do desejo humano de viver outras vidas é o relato do romancista francês Julien Green, cujo título, Se eu fosse você..., já dá a medida e intensidade do seu assunto. Fabien é um jovem insatisfeito com a sua existência. Um belo dia conhece Brittomart, um subalterno do demônio, que, mediante uma fórmula verbal, lhe confere o poder de mudar de vida, viver a existência de outra pessoa. Daí por diante, Fabien perpetrará um círculo de experimentais transformações sem jamais se dar por satisfeito: torna-se um homem rico, depois um outro dotado de imbatível força física, ocupa mais tarde o corpo de um fervoroso servo de Deus e, por fim, se transforma num homem de irresistível beleza. Sua insatisfação, contudo, não se dissipa. A cada transformação, seu desejo de mudança se renova. No fundo, o que ele busca é a perfeição, e esta é impossível. Quando afinal se decide por voltar a ser ele próprio, descobre que já não é senhor de sua vontade, nem de sua vida, nem de seu corpo, que pertencem agora ao demônio. Fabien pagou um preço à altura do poder que lhe foi conferido. E tarde demais descobriu que a melhor vida, a verdadeira, é a nossa própria, por constituir a única que possuímos.
O motivo por que as pessoas se permitem sucumbir ao fascínio das histórias, ocupando sem agravo tanto o papel de emissores quanto o de receptores, está intimamente ligado ao prazer que alcançam em experimentar, de longe, num envolvimento casual porém desejado, novas realidades e outras consciências, as quais as destacam de seu cotidiano fastidioso e precário. Através da ficção nossa vida se torna diversa, e nos acrescentamos experiências que necessariamente não viveremos, mas que, assim mesmo, nos enchem de luz e sentido. Todos os homens almejam uma outra vida e, no fundo, ainda que inconscientemente, a procuram. Isso é certo, pois nunca estão satisfeitos, o dia-a-dia monótono os sufoca; querem sempre algo mais, uma fração de "outra coisa", mais benéfica ou, se não isso, mais trágica. Mesmo porque, como bem disse o escritor húngaro Dezsö Kosztolányi: "Não há no mundo homem inteiramente feliz. Não há, nem pode haver". Portanto, é por "mudança" que os homens se entregam de corpo e alma às histórias: para se sentirem outros, aos quais a felicidade sorria ou o desatino faça sofrer. No breve e quimérico espaço de um relato ficcional a existência humana, por um tempo, se transforma, passa a outra coisa, subverte a dolorosa imposição do acaso – ou de Deus.
MAYRANT GALLO. Ensaio publicado no Correio da Bahia, em 14/12/2003.